tertúlia oficial do conjunto azorrague músico-poético The Galarzas (remasterizado)
30.7.04
Santana W Lopes
Por incrível que pareça, hoje dei por mim a concordar com tudo o que o MST disse no jornal sobre o que se passa por lá e por cá. E já não é a primeira vez. Ó meu Deus, qualquer dia estou a ler o Equador...
Fora de Serviço
Lisboa. Centro da cidade. Zona da Baixa, Chiado, Camões, Bairro Alto. Meia noite e meia. Noite quente de quinta-feira. Fim do mês. Verão. Gente, muita gente. Turistas, estudantes, jovens, adultos, amigos, conhecidos, colegas, pessoas. Aos milhares. Aos magotes. Uma dúzia de caixas Multibanco. Em todas, a mesma notícia, a fundo vermelho: «FORA DE SERVIÇO - DIRIJA-SE AO MULTIBANCO MAIS PRÓXIMO». Uma dúzia de caixas Multibanco fora de serviço... Em todas, as mesmas filas de gente à espera, impaciente. Fora de serviço. Como tudo em Portugal. Como todo Portugal: FORA DE SERVIÇO - DIRIJA-SE AO PAÍS MAIS PRÓXIMO.
29.7.04
Poema de Mestre Nestor Alvito
Arde-me
Tudo arde
Tudo ardeu
Ardeu-me a casa
Ardeu-me o carro
e a minha gente
Ardeu-me a terra
Ardeu-me a aldeia
e o meu país
Ardeu-me a alma
Ardeu-me o coração
e a vida
Tudo arde
Tudo o fogo consome
Ardem-me chamas nos olhos
da dor da minha gente
Ardem-me labaredas no peito
do choro dos meus vizinhos
que choram lágrimas fora de tempo
que mal chegam para apagar as chamas
que ardem cá dentro
Tudo arde
Tudo se perde
Nada se transforma
(in Édito, 2003)
1 d'Outubro, dia feriado
É uma notícia orgásmica: no dia 1 de Outubro, esta beluga e o seu mestre vão ser homenageados na toponímia lisboeta. Vem aí a Rua Galarza, a Rua Shegundo Galarza - avisa-nos o nosso mui apróchego Marujo, a quem ficamos deveras gratos.
Ó litâneas, ó medusas, ó que grande alegria, ó que desculpa para mais uma tertúlia, uma donzela de copos, uma cadela de noite...
Fado do Opróbrio
Rosete, tadinha Rosete
Entrara um no coito, sairam do útero sete
Rosete, tadinha Rosete
Rapa as pernas com gillette
Rosete, tadinha Rosete
Por não seres santanete
Tadinha, tadinha Rosete
Rapa as pernas com gillette
Rosete, tadinha Rosete
Por não seres santanete
Tadinha, tadinha Rosete
Duran Clemente, estás vingado, pá!
«Lisboa, 28 Jul (Lusa) - O Serviço de Bombeiros e Protecção Civil garantiu hoje que a recusa por Portugal de meios aéreos de combate a incêndios disponibilizados pela Alemanha, Noruega e Reino Unido baseou-se em razões de ordem técnica e não económicas.»
O meu Sonho .136
O meu sonho é perceber porque aqueles que nada conseguem ver querem sempre mirar a ponta do corno.
A verdade...
...é que Teresa Caeiro ainda há-de ser filha de Alberto Caeiro. Mas a família é muito discreta.
Inédito
Tirar as grainhas
Pelar
Trincar com os dentes da frente
Os molares não
Encontrar uma boca
Fresca
Um decote em
Explosão de líbido
Um certo olhar
Tirar as grainhas
Pelar
Ficar com a polpa inteira
Não trincar
Fazer derreter
Entre a língua e o céu da boca
Tirar as grainhas
Pelar
Abrir a janela
E voar
de Eustáquio Pinho, Vaticano e Vatitubo, Pinhel, 1969
O coronel V (comportamentos tipo passe)
Desta vez, deixei o telefone tocar quase até chegar ao gravador. Dez minutos depois, o Coronel ligou-me:
- Está?
- Sou eu.
- Ah! Viva! Diga lá!
- É por causa do programa do governo.
- Qual programa? Da palha, que é o que se dá aos burros.
O Coronel anda muito enraivecido.
28.7.04
O melhor remédio...
...para aguentar este Portugal, série Santana/Portas 2004:
(legal, eficiente e sem efeitos secundários - receitado pelos melhores médicos, farmacêuticos, políticos, wannabes, doutores da mula russa e cães-de-água)
Ritual do (infelizmente cada vez mais) Habitual
«Hitler's syphilis-ridden dreams almost came true.
How could it happen? By taking control of the media.
An entire country was led by a lunatic...
We must protect our First Amendment,
before sick dreams become law.
Nobody made fun of Hitler??!»
(Jane's Addiction, Ritual de lo Habitual, versão «clean»)
A Bola
O jornal Record descobriu-nos o segredo. É verdade o que diz aquele diário desportivo: o nosso mui caro e secreto irmão Sexteto é o novo jogador do F.C.Porto:
Terca-Feira, 27 de Julho de 2004
Sexteto apresentou-se e fez exames médicos
Só mais um desabafo ao fim de duas horas nas Finanças à espera de um papel que devia estar pronto há um mês mas de que eles se esqueceram
(e para o qual ainda me obrigaram a pagar uma pipa de massa):
PÔRRA MAIS A ESTA MERDA!
Apenas um desabafo ao fim de 18 horas de trabalho e de um ano sem férias decentes nem dinheiro na conta nem paciência para aturar este país queimado:
MERDA!
27.7.04
Imbecilidade
Pelo direito à imbecilidade temporária, manifesta-se o Público, colam-se os The Galarzas. Afinal, nós também usamos...
26.7.04
23.7.04
A guitarra chora baixinho (Ouvido na rua)
«Durante muitos anos, não consegui ouvir a música de Carlos Paredes. Fazia-me chorar. Hoje, pela primeira vez em muitos anos, voltei a ouvir a música de Carlos Paredes. Hoje, pela primeira vez, não consegui chorar... É uma dor imensa demais.»
Pelas Paredes da memória
E por ele? Por ele alguém pendurou bandeiras à janela? Por ele alguém fez parar a nação? Alguém pintou de verde e vermelho o coração? Por ele alguém fez cantar o povo que o ouviu dedilhar a guitarra até todas as lágrimas do mundo se soltarem num canto novo, eterno e engrandecedor?
E por ele? Por ele alguém pendurou bandeiras à janela? Por ele alguém acenou um adeus perpétuo?
O primeiro adeus
Já se afogava em desculpas aquela mulher que, em 1993, chegou ao pé de mim e, ao lado da sala cheia, quinhentas pessoas lá dentro, me disse: "O Carlos não pode vir. Ficou muito nervoso e não se consegue quase levantar. Ele ainda se zangou connosco, mas não o deixámos vir".
À época, a minha preocupação era saber que desculpa arranjar para a multidão que enchia, preenchia, todo o salão. Pedi a esta mulher que subisse a palco e explicasse a todos o que se passara. Ela foi. Disse a todos que Carlos Paredes não vinha (um murmurio em coro, nada mais, ninguém arredou pé), porque estava doente, mas que mandava um pedido de desculpas.
Que me lembre, ninguém protestou. Foi o primeiro concerto cancelado do homem de mil dedos. Os que ali estiveram, naquela noite, nos Olivais, na velha Sociedade Filarmónica União e Capricho Olivalense, lembram-se.
Hoje, o Carlos foi.
Com um encordamento novo, a guitarra de sempre, o ar de homem-menino.
Poema de Mestre Nestor Alvito
Pessimismo
Hoje...
já não.
Ontem...
esqueci-me.
Amanhã...
talvez.
Ou nunca
mais.
(in Salada de Brutas, edição de autor, 1977)
22.7.04
Apresentando... Genebra Caiado
Dorme do-dorme
Português
Va-vão levar-te
Outra ve-vez
Para o la-lado do
Ga-gamanço
Está-tás num trapo
E és m-manso
Por Genebra Caiado, poeta gago infantil, O Mu-mugir das Va-vacas, Olhão, 2004
Ajuda aos Secretários de Estado
The Galarzas sabem que andam aí secretários de Estado sem cadeiras, sem lugares, com as malas e as mesas às costas na Cidade, ora para a rua do Século, ora para a Praça de Londres, ora para o Caldas, ora vai um e leva a cadeira que lhe faz bem para as costas, ora outro que chega mas está lá um ministro sentado e vai para casa, ora que chamam gente de outras profissões que não especializadas para mudar as muletas, enfim. Uma canseira.
Pois não desesperes Teresa Caeiro, não chores Diogo Feyo, não soçobres, ó Patinha Antão. Aqui está o mapa. Não todo, mas aquela que vos interessa para vossa devoção.
And now, Mr Barroso
Anafado, de olhos castanhos, carão moreno,
Bem servido de pés, meão na altura,
Triste de facha, o mesmo de figura,
Nariz alto no meio, e não pequeno;
Incapaz de crer num só partido,
Mais propenso à fuga do que à pachorra;
Bebendo em níveas mãos, por mala escura,
De zelos infernais letal veneno;
Devoto incensador de mil saudades
(Digo, de cavacos mil) num só momento,
E somente no altar amando as uvas,
Eis Durão em quem não luz algum talento;
Saíriam dele mesmo estas verdades,
Num dia em que se acharia mais pachorrento.
Desculpas ao Bocage
O Mistério do Ministério
Tudo lhe corria bem - o Presidente tinha medo dele, o Governo funcionava em velocidade de cruzeiro, o povo não gostava dele mas também não votava... enfim, tudo estava bem. Mas ainda assim, o Ministro estava macambúzio. Talvez lhe faltasse a voz. Talvez lhe faltasse o amor da nação. Talvez lhe faltasse a gravata da sorte. Talvez lhe faltasse o amor lá em casa. Talvez... Ou talvez lhe faltasse apenas acreditar em si próprio. Apenas aquele carisma que tem quem acredita em si, quem confia em si, quem gosta de si próprio. Seria isso? Seria essa a razão dos seus olhos cansados e velhos? Seria essa a causa dos seus cabelos brancos e das suas mãos trementes? Seria essa a sua falta perante Deus e os Homens?
Tanto tempo perdeu o Ministro a pensar nisso. Tanto tempo investiu o Ministro nessa causa. Que quando acordou, já o país era outro. O Presidente tinho sido deposto pelos militares descontentes com a falta de uma guerra. O Governo tinha sido expulso e enviado em galés para as novas colónias entretanto descobertas num cantinho esquecido do mundo. O povo tinha sido lavado, enfeitado e desligado com fintas e fitas de caubóis. E o país rodava à deriva, perdido, distraído, ingénuo... cativado pelas trovas de um flautista galanteador e de um manipulador sem escrúpulos, dupla de canastrões circenses que já havia tratado da saúde a outros 16 países antes de chegar à nação do Ministro.
Acabado o serviço nesta última paragem, o incansável duo fez as malas, guardou a poção da sua arte (um potente veneno macambuziador), e seguiu viagem, deixando para trás um megafone debitando a todas as horas a mais leve e sedutora canção do bandido. O Ministro - agora homem novo, alegre e consciente - olhou em volta e sentiu-se bem.
Ministérios Futuros e suas hipóteses
- Ministério da Derrapagem e Economia Paralela - Dias Loureiro
- Ministério das Desculpas Políticas - Luís Delgado
- Ministério para Falar Manso com Sampaio - Ana Gomes
- Ministério do Vasilhame e das Garrafas 750cl- Narana Coissoró
- Ministério da Cabala - Moita Flores
- Ministério da Venda de Armas para os PALOP - Grupo Coral "Bloco Central"
- Ministério do Branqueamento da História - Fernando Rosas e Freire Antunes
- Ministério do Pneu Sobressalente e Afins - Miguel Pais do Amaral
- Ministério da Mão Pelo Pêlo - Vasco Graça Moura
- Ministério dos Blogues e de José Magalhães - Pacheco Pereira
- Ministério do Antigos Combatentes Contra os Combatentes - Manuel Alegre
- Ministério do Estado de Espírito - Eduardo Prado Coelho
- Ministério do Cinzeiro - João Bénard da Costa
- Ministério da Culpa - D. Inês de Castro
21.7.04
O coronel IV (comportamentos tipo passe)
O coronel está cada vez mais bem disposto. Agora, diz que se tornará um hipocondríaco altruísta, porque está farto das doenças só para ele sem que ninguém tenha esse desidrato.
Entretanto, o Coronel telefonou-me já à tardinha:
- Sabe quem são estes do novo Governo?
- Sei lá eu...
- São os piratas, do Astérix. Afundam-se antes de se lhes tocar.
O coronel depois tossiu, por causa do SG Gigante. O sinal ficou verde. Ia eu a pensar que cada vez é mais difícil tudo. Até meter a primeira, depois do telefonema do Coronel.
20.7.04
Má digestão
Lendo, vendo e ouvindo os mais recentes debates, desabafos e opiniões apercebi-me de um pormenor. O problema do Governo de Durão Barroso não foi má gestão. Foi indigestão...
Citemos, pois
«Esperava-se muito pouco de Santana Lopes? Pois bem, ele está a cumprir as expectativas.»
(João Miguel Tavares, in DN)
O regresso da Madre Superiora
Ai que saudades, que saudades, 'tá a ver? Quase um ano depois da primeira investida, a nossa mui cara e catita Sô Dona Paula Bobone volta ao ataque, plena de prosopopeia, ritmo no linguajar e um perfeito domínio da revienga conversadeira. Ora leia-se no «Inquérito de Verão» do DN de hoje:
«1. Qual a sua ideia de felicidade perfeita?
A minha maior felicidade seria ter talento.
2. Que talento gostaria mais de possuir?
Gostaria de ter talento para ser feliz.
3. Qual considera a sua maior realização?
A minha maior realização é de pouco ou nada me arrepender.
4. De que é que se arrepende mais na sua vida?
Arrependo-me quando me sinto realizada.
5. O que valoriza mais nos seus amigos?
Nos meus amigos valorizo a extravagância.
6. Qual é a sua maior extravagância?
Tenho a extravagância de valorizar os amigos.»
Quando fôr grande, também quero ser assim, como a Paula Bobone: talentoso, extravagante, estúpido que nem uma porta, convencido que nem um carapau de corrida, sei lá...
Coincidência
Esta semana, o Diário de Notícias está a disponibilizar um DVD de... Santana. O fundo da capa é... cor-de-laranja.
Só p'ra dizer...
...I'm back! Mas entretanto aqui pelo Armazém dos Blogs só vejo coisas novas e giras. Quanta alegria... Já dá para mudar mais facilmente o tipo de letra, o tamanho da dita e a sua cor, já podemos colocar imagens sem ter que andar à procura da cábula, já dá para
- numerar
- sem ter que
- escrever
- os números
- pontinhos
- antes
- da frase
e até já se justifica à vontade do freguês.
Isto assim fica muito mais fácil. Perde metade da piada, mas é mais fácil.
19.7.04
Um belo dia
Olá leitor,
Bem vindo ao país (se está noutro lado, sorte sua), onde finalmente podemos escrever
O primeiro-ministro, Santana Lopes, acompanhado do ministro de Estado, Paulo Portas, estiveram hoje na inauguração...
É bem bonito. Diga lá se não se sente mais confiante, mais tranquilo, mais triunfante?
É isso, leitor. Nada de análises políticas, feitas com agulhas de agendas escondidas. Encaremos o futuro com o mesmo fulgor que agora nos surge esta oportunidade única.
Acabou-se o stress. Viva a liberdade.
16.7.04
Santana Lopes convida José Sócrates
Futuro ex-líder do PS deverá ocupar a pasta da Vacuidade e Lugares Comuns
Pacheco Pereira refugiado na embaixada da Argélia
«É o único local onde não deve haver interferência deste Governo», disse o ex-eurodeputado, que comunica com o mundo através de um blogue na internet e, sabem os The Galarzas, encomendou já uma cadeira igual à de Stephen Hawking para que, no programa de tv em que participa, os santanistas não oiçam a sua voz.
Manuel Alegre disponibilizou-se já para lhe dar o velho transmissor de rádio que usava no país de origem da embaixada.
Passeio
Frondosa vítima
Calhada em chão
Foste tu que
A medo
Compraste um cão?
Frondosa viuva
De seios fartos
Foste tu que
Lúbrica
Semeaste os factos?
Frondosa terra
Imensa cheia de mar
Foste tu que
A tempo
Te deixaste
Afundar?
Frondoso índio
De púbis arregaçado
Foste tu que
Do levante
Nos pegaste
Os chatos?
de Eustáquio Pinho, A Nau Ladies and Gentlemen, Corvo, 1995
15.7.04
Despacho interlúdico
Este Galarza vai trabalhar. Para o campo. Nos próximos dias, estarei num bulício bucólico, em silêncio político, retiro estrutural e fim-de-semana sabático. De caneta numa mão e saudades na outra. Porque o que tem que ser tem muita força e mugidos de vaca não pagam almoços.
Se me amam, deixem-me ir.
14.7.04
13.7.04
Ouvido na rua...
...frente a um quiosque:
«Bom dia, tem revistas porcas, revistas porcas, porcas? Tem revistas porcas, tipo... tipo a Playboy, a Playboy? Tem a Playboy? E outras marcas? Tem de outras marcas? A Maximen? Revistas porcas... (...) Tem? Revistas porcas? Quero três. Três! Revistas porcas, nojentas. Sim, sim! Ranhosas! Tem revistas ranhosas?»
O meu Sonho .133
(Em resposta ao meu mui querido Quarto)
O meu sonho é que que as minhas decisões possam ser tomadas por mim e não por outros em meu nome nos bastidores.
Ainda agora
«Ainda agora, descia eu com umas postas de bacalhau pela rua das Flores, quando ouvi um índio. Fui a correr.»
Monsanto Guedes, 1937, sobre a necessidade
12.7.04
Amargor
O JMF avisou, os The Galarzas foram ver e confirmaram: a demissão de Ferro já deixou ferrugem - o Canhoto também se demitiu, porque...
«Não me apetece exercer o direito de expressar a opinião a propósito de um país onde ela é vista como "dispendiosa e irrelevante", não me apetece falar sobre partidos em que não me revejo, nem comentar os dislates de um governo circense e muito menos expressar o desprezo que sinto pelo representante máximo da nação.»
Assim não vale. Assim não tem piada...
Poema de Pablo Neruda...
...no centenário da sua vida:
XXXI
A quién le puedo preguntar
qué vine a hacer en este mundo?
Por qué me muevo sin querer,
por qué no puedo estar inmóvil?
Por qué voy rodando sin ruedas,
volando sin alas ni plumas,
y qué me dio por transmigrar
si viven en Chile mis huesos?
in Libro de las Preguntas, Buenos Aires, 1974 (edição póstuma)
Right Wing Horror Government Show
Frank:
How d'you do, I
See you've met my
Faithful handyman.
He's just a little brought down
Because when you knocked
He thought you were the candy man.
Don't get strung out by the way I look.
Don't judge a book by its cover.
I'm not much of a man by the light of day
But by night I'm one hell of a lover.
I'm just a sweet transvestite
>From Transexual, Transylvania.
Let me show you around
Maybe play you a sound.
You look like you're both pretty groovy.
Or if you want something visual
That's not too abysmal,
We could take in an old Steve Reeves movie.
Brad:
I'm glad we caught you at home,
Could we use your phone?
We're both in a bit of a hurry.
Janet:
Right.
Brad:
We'll just say where we are,
Then go back to the car.
We don't want to be any worry.
Frank:
Well you got with a flat, well, how `bout that?
Well, babies, don't you panic.
By the light of the night it'll all seem alright.
I'll get you a satanic mechanic.
I'm just a sweet transvestite
>From Transexual, Transylvania.
Why don't you stay for the night? (Night)
Or maybe a bite? (Bite)
I could show you my favourite obsession.
I've been making a man
With blond hair and a tan
And he's good for relieving my... ...tension
I'm just a sweet transvestite
>From Transexual, Transylvania.
HIT IT, HIT IT!
I'm just a sweet transvestite. (Sweet transvestite)
Sweet transvestite
From Transexual, Transylvania.
So - come up to the lab,
And see what's on the slab.
I see you shiver with anticipation.
But maybe the rain
Isn't really to blame.
So I'll remove the cause.
But not the symptom.
The Galarzas congratulam-se pela criatividade de Richard O'Brian ter finalmente chegado a um país, sob a forma de governo
11.7.04
Poema de Mestre Nestor Alvito
Sem Dias
A poesia morreu
Desceu triste numa lenta madrugada
A face foi-se
Fechou-se enfim numa tarde descansada
O coração parou
Bateu mais forte numa última chamada
A vida perdeu
Ficou à solta, meio louca enjaulada
Sem poetas para tecer uma cantada
Sem dias para contar à desgarrada
Sem futuro para escrever esta cartada
(inédito de Mestre Nestor Alvito - regressado do exílio literário por via das nuvens negras se avizinham - em homenagem a Sophia, Henrique e Maria de Lurdes)
10.7.04
A morte saiu à rua
Abrantes, 1930 - Lisboa, 2004
Do sentimento trágico da vida
Não há revolta no homem
que se revolta calçado.
O que nele se revolta
é apenas um bocado
que dentro fica agarrado
à tábua da teoria.
Aquilo que nele mente
e parte em filosofia
é porventura a semente
do fruto que nele nasce
e a sede não lhe alivia.
Revolta é ter-se nascido
sem descobrir o sentido
do que nos há-de matar.
Rebeldia é o que põe
na nossa mão um punhal
para vibrar naquela morte
que nos mata devagar.
E só depois de informado
só depois de esclarecido
rebelde nu e deitado
ironia de saber
o que só então se sabe
e não se pode contar.
Natália Correia
Maria de Lurdes Pintasilgo morreu. Ontem. De madrugada. O corpo da mulher que chefiou o V Governo Constitucional vai para uma capela na Basílica da Estrela a partir das 16:00 deste sábado, 10 de Julho.
Centro de documentação 25 de Abril
Nos tempos em que fizemos as malas
No dia em que a mala ficou pronta entregaram um folheto de publicidade com descontos nos fatos de banho e num leitor de DVD com marca ilegível, composta por sete vogais e três consoantes, o teu pai colecionou os selos do Record e acabou por adquirir uma magnífica enciclopédia onde a jugoslávia ainda vinha inteira, a minha irmã tinha casado não faz um mês e o gajo que casou com ela veio ao pé de nós, sorriu e disse
a isabel está grávida
e sorriu outra vez e abriu uma garrafa, mas eu continuava a ouvir
a isabel está grávida
e a pensar nele, ele estaria o quê?, doente?, imortal?, cansado?
a isabel está grávida
e quando saimos de casa, com o miúdo ao colo, o cão a saltar, uma vizinha a oferecer ajuda, ainda viamos na televisão ligada um homem de cabelo branco a dizer que era o garante da democracia e que os tinha debaixo de olho e
a isabel está grávida
e ele ali com aquele sorriso de quem a emprenhou mas agora o problema é dela, e o homem de cabelo branco a dizer que não perdoaria falhas, e eu, na minha cabeça, de repente ouvi o ruben, ou como se chama o marido da minha irmã a dizer
o homem de cabelo branco engravidou-nos,
o que explicaria muita coisa
País CPU
Desde esta noite, Portugal é o país spam. Santana e Portas são trojões que se infiltram. O populismo um vírus. A esquerda um ficheiro comprimido. O Sampaio o sistema operativo que "crashou".
Na velha anedota informática, só resta uma solução: deitar abaixo e voltar a ligar.
9.7.04
Obrigado, Sr. Presidente
Por nos fazer acreditar que, apesar de tudo, os quase 60% de portugueses que não votaram nas últimas eleições é que tinham razão. Por decidir que decidir por nós é que é correcto, por isso não vale a pena a gente preocupar-se. Por nos dizer «vão lá para a praia amanhã, que a gente trata disto entre nós». Por me dizer que afinal não tinha valido a pena eu levantar-me cedo para ir votar, porque a maioria amanha-se sem o meu voto. Por ter ouvido os portugueses: se ganhou a abstenção, o povo que se abstenha desta decisão.
Eu não me abstive, Sr. Presidente. E também ia ter gostado de não me abster desta vez. Mas agora, depois de tanta prosopopeia e apelo contra a abstenção, é o Sr. Presidente e a maioria PPD/PSD+CDS/PP que apregoam a mais descarada abstenção.
Obrigado Sr. Presidente por nos confirmar que, realmente, GANHOU A ABSTENÇÃO!
Parece que Ferro se vai
Ah pois! Andam para aí a dizer que o Ferro Rodrigues, não tarda uma hora, vai bater com a porta. A palhaçada, assim, não tem meio de acabar.
Desilusão Antecipada
Os The Galarzas souberam há uma hora e coisa, de fonte inquinada, que o Residente da República se prepara para atirar o Santana e o Portas para o poleiro.
Os The Galarzas aplaudem a decisão. É que há muito sabemos que moramos em Portugal. Líricos são os outros.
Beijos.
Então é esse o truque!
Os The Galarzas descobriram mais uma grande conspiração para toldar a mente dos portugueses e fazê-los esquecer a Cabala Maior. Depois do futebol, o álcool! A prova aí está, em anúncios de jornal que convidam:
«No Dia do Vinho, domingo, 11 de Julho, visite uma adega, quinta ou garrafeira. Peça um vinho, espumante, um branco, um rosado ou um tinto e faça uma saúde à vida.»
Como se fosse preciso um anúncio para os portugueses irem beber vinho...
Perigo no mail dos The Galarzas
O he-male dos The Galarzas foi recentemente alvo de um atentado terrível e fatal, perpetrado por um bem conhecido anónimo. O teor da e-missiva não pode ser aqui revelado, tendo em conta a sua perigosidade. Tudo o que podemos revelar - para que vós, nossos mui queridos e ex-timados leitores, possam avaliar o nível de terror inerente à carta - é o seu subject:
«Concurso no Colombo cancelado! STOP! Vai-se proceder à sua transferência para outro local! STOP! NOTÍCIAS FRESCAS NA PRÓXIMA SEMANA! SALSA FOREVER! STOP!»
...e a forma rompante como amedrontavam logo a abrir, com um chocante «OLÁ BAILONAUTAS!», só para terminar com um muito suspeito e tenebroso «SALSA CON FUEGO! Até já ou lá, ou até à próxima dança».
Mais do que isto, caríssimos e louvados e-leitores, é-nos impossível citar, tal o medo e a angústia provocados.
Jornal diário plagia The Galarzas
Um conhecido jornal diário português traz hoje em destaque uma proposta para o elenco do possível governo de Santana Lopes. Foi com estupefação que, esta manhã, os The Galarzas deram de caras com este disparate. Estupefação justificada pelo simples facto dos The Galarzas terem já aqui publicado proposta não só semelhante como também parecida e até idêntica. Aliás, quase igual, tirando alguns pormenores de somenos importância, que se devem, decerto, a uma tentativa de disfarçar o plágio.
Este jornal alinha na pista os nomes de Cinha Jardim (Ministra Adjunta), Elsa Raposo (Finanças), Pimpinha Jardim (Defesa), Lili Caneças (Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente), Betty Grafstein (Negócios Estrangeiros), Margarida Prieto (Educação) e Marisa Cruz (Cultura) - proposta abusivamente aproximada da anunciada pelos The Galarzas logo a 25 de Junho.
Apesar das distintas diferenças, os The Galarzas não têm pejo em acusar este conhecido matutino de expropriação de ideias e roubo de pensamentos (e até mesmo de espionagem profissional). Em breve, serão activados os meios necessários para a reposição da verdade e do bom nome desta beluga. Ou então cagamos para o assunto e rimo-nos todos juntos...
8.7.04
Sampaio responde com a Carta de Paulo aos Coríntios
O Presidente da República enviou ou há-de enviar para os jornais uma resposta à argumentação escrita do CDS, baseada em escritos do líder Portas, na conhecida "Carta de Paulo aos Coríntios".
Na violenta réplica, Sampaio lembra que Paulo escreveu: "32 Em tudo quanto vocês fizerem, eu quero que estejam livres de preocupação. Um homem solteiro pode despender seu tempo realizando a obra de Deus e pensando no modo de agradá-Lo. 33 Mas um homem casado não pode fazer isso tão bem; ele precisa pensar em suas responsabilidades aqui na terra e em como agradar a esposa".
Neste ponto o Presidente remete para as palavras de Paulo que, uma vez casado, tem mais que fazer do que os solteiros e, note-se, "ele precisa pensar em suas responsabilidades aqui na terra".
Mais à frente, lê-se no comunicado de Belém: «Diz Paulo: «10 Irmãos, em nome de nosso Senhor Jesus Cristo suplico a todos que concordem uns com os outros no que falam, para que não haja divisões entre vós e, sim, que todos estejam unidos num só pensamento e num só parecer». A Presidência da República considera que ainda não viu sinais claros de que todos os líderes partidários estejam de acordo sobre eleições antecipadas ou a continuação de um governo da actual maioria, o que vai contra o defendido por Paulo".
O violento documento caiu ou cairá mal nas hostes do Largo do Caldas.
6.7.04
Sonda Cassini encontra Pacheco Pereira
A estampa que acima se reproduz foi enviada através do espaço profundo e mostra, pela primeira vez, a verdadeira morada de José Pacheco Pereira (mancha branca, em baixo, resultado do reflexo da já fraca luz solar na barba de Pacheco).
Os cientistas há muito procuravam a sua verdadeira localização, uma vez que há anos ninguém o vê em carne e osso. Alvitrou-se mesmo que Pacheco Pereira fosse a versão masculina de Ananova. Agora, revolucionária fotografia, confirma: José Pacheco Pereira estã em Titã, lua de Saturno, onde representará a UNESCO durante os próximos tempos.
Antes, passou quatro mandatos em Ganimedes, lua de Júpiter, como deputado europeu junto das comunidades gasosas. Em Portugal há quem reclame o seu regresso, para que as novas gerações - anteriores aos dias em que Pacheco aparecia em público - possam ver este ícone que tem tanto de Marx no físico como de Cavaco no intelecto. A sua ausência levou mesmo Santana Lopes a desabafar: "Pobre país, o nosso".
Scolari ajuda Judite de Sousa
No final da primeira parte da entrevista com Santana Lopes, feita ontem à noite nos estúdios de Chelas, o novo presidente do PSD ganhava por 3-0 a Judite de Sousa, tendo atacado bem pela ala direita e central e apanhando à toa a entrevistadora.
Os The Galarzas estão em condições de avançar que, no intervalo, Luiz Filipe Scolari, presente nos estúdios, fez algumas substituições, levando a que a entrevistadora que mais vezes foge às perguntas, apesar das boas respostas dos entrevistados, tivesse sucesso.
Assim, ao intervalo, as substituições:
1. Saiu OLHAR VAGO DE JUDITE e entrou OLHAR DE PACHECO QUANDO É ABRUPTO.
2. Saiu TENHO UNS SAPATOS DE SALTO QUE SE PODEM VER QUANDO O PLANO É ABERTO e entrou TENHO UMA CÁBULA NA MÃO ESQUERDA PARA NÃO ME ESQUECER DO QUE PERGUNTEI.
3. Já no final da segunda parte, Scolari fez entrar DIZ LÁ QUE ÉS UM DANDY, em substituição de SAIS MAIS NAS REVISTAS COR-DE-ROSA DO QUE EU.
O resultado foi um estrondoso 4-3, vitória de Judite, com Santana no tapete, a dizer algaraviadas sozinho e lugares comuns.
Vai um copinho?
Nós não queremos ser acusados de promover más condutas e comportamentos desviantes mas não há como impedir a propagação da coisa... Primeiro foi a revista côr-de-cânhamo, agora é esta bebida refrescante de sabor a natureza:
Ah, como é bonito o engenho que faz arte...
5.7.04
A normal idade
E hoje o país regressa ao normal. O Primeiro-Ministro demite-se. O Presidente almoça com jogadores de futebol. Os médicos fazem greve. Os incêndios continuam. Nas praças, restos de bandeiras de vários países confundem-se com os bêbados ainda dormentes... Enfim, tudo normal.
4.7.04
É o destino
Não podia acabar de outra forma um Euro que teve como tenente um ministro chamado Sócrates...
Aquele abraço
O desalento
A contento
Entra agora nas portas
E postigos
Choram lusos,
Todos Figos,
Vão de pranto
Bradam bosta
Costinha, Maniche
Rui Costa;
Na linha lateral
Com a bandeira
Já fraldada,
Olha sem perdão
Portugal,
Mátria violada.
Felizmente evitámos
Com galhardia enfastiada
Uma maior cabazada.
Mas as santas dirão
Se amanhã não volta
C'oa força das naus e das ondas
A grande depressão.
de Eustáquio Pinho, Sal Temos, Bucareste, 2004
Top perna
Eleitas as melhores pernas do ano. Eis o resultado:
Top 10 Gaijas:
1 Kylie Minogue
2 Cameron Diaz
3 Jennifer Ellison
4 Nicole Kidman
5 Anna Kournikova
6 Naomi Campbell
7 Kate Moss
8 Victoria Beckham
9 Tara Palmer-Tomkinson
10 Jodie Kidd
Top 10 Gaijos:
1 David Beckham
2 Brad Pitt
3 Johnny Wilkinson
4 Tim Henman
5 Orlando Bloom
6 Peter Andre
7 Jude Law
8 Leyton Hewitt
9 Peter Phillips
10 Ian Thorpe
3.7.04
Poema
"A minha vida é o mar o Abril a rua
O meu interior é uma atenção voltada para fora
O meu viver escuta
A frase que de coisa em coisa silabada
Grava no espaço e no tempo a sua escrita
Não trago Deus em mim mas no mundo o procuro
Sabendo que o real o mostrará
Não tenho explicações
Olho e confronto
E por método é nu meu pensamento
A terra o sol o vento o mar
São a minha biografia e são meu rosto
Por isso não me peçam cartão de identidade
Pois nenhum outro senão o mundo tenho
Não me peçam opiniões nem entrevistas
Não me perguntem datas nem moradas
De tudo quanto vejo me acrescento
E a hora da minha morte aflora lentamente
Cada dia preparada"
Sophia de Mello Breyner Andresen (1919-2004)
Curvados, The Galarzas
2.7.04
Por favor, Sampaio.
O CORVO
Numa meia-noite agreste, quando eu lia, lento e triste,
Vagos, curiosos tomos de ciências ancestrais,
E já quase adormecia, ouvi o que parecia
O som de alguém que batia levemente a meus umbrais
«Uma visita», eu me disse, «está batendo a meus umbrais.
É só isso e nada mais.»
Ah, que bem disso me lembro! Era no frio dezembro,
E o fogo, morrendo negro, urdia sombras desiguais.
Como eu qu'ria a madrugada, toda a noite aos livros dada
P'ra esquecer (em vão) a amada, hoje entre hostes celestiais —
Essa cujo nome sabem as hostes celestiais,
Mas sem nome aqui jamais!
Como, a tremer frio e frouxo, cada reposteiro roxo
Me incutia, urdia estranhos terrores nunca antes tais!
Mas, a mim mesmo infundindo força, eu ia repetindo,
«É uma visita pedindo entrada aqui em meus umbrais;
Uma visita tardia pede entrada em meus umbrais.
É só isso e nada mais».
E, mais forte num instante, já nem tardo ou hesitante,
«Senhor», eu disse, «ou senhora, decerto me desculpais;
Mas eu ia adormecendo, quando viestes batendo,
Tão levemente batendo, batendo por meus umbrais,
Que mal ouvi...» E abri largos, franquendo-os, meus umbrais.
Noite, noite e nada mais.
A treva enorme fitando, fiquei perdido receando,
Dúbio e tais sonhos sonhando que os ninguém sonhou iguais.
Mas a noite era infinita, a paz profunda e maldita,
E a única palavra dita foi um nome cheio de ais —
Eu o disse, o nome dela, e o eco disse aos meus ais.
Isto só e nada mais.
Para dentro estão volvendo, toda a alma em mim ardendo,
Não tardou que ouvisse novo som batendo mais e mais.
«Por certo», disse eu, «aquela bulha é na minha janela.
Vamos ver o que está nela, e o que são estes sinais.»
Meu coração se distraía pesquisando estes sinais.
«É o vento, e nada mais.»
Abri então a vidraça, e eis que, com muita negaça,
Entrou grave e nobre um corvo dos bons tempos ancestrais.
Não fez nenhum cumprimento, não parou nem um momento,
Mas com ar solene e lento pousou sobre meus umbrais,
Num alvo busto de Atena que há por sobre meus umbrais.
Foi, pousou, e nada mais.
E esta ave estranha e escura fez sorrir minha amargura
Com o solene decoro de seus ares rituais.
«Tens o aspecto tosquiado», disse eu, «mas de nobre e ousado,
Ó velho corvo emigrado lá das trevas infernais!
Dize-me qual o teu nome lá nas trevas infernais.»
Disse-me o corvo, «Nunca mais».
Pasmei de ouvir este raro pássaro falar tão claro,
Inda que pouco sentido tivessem palavras tais.
Mas deve ser concedido que ninguém terá havido
Que uma ave tenha tido pousada nos seus umbrais,
Ave ou bicho sobre o busto que há por sobre seus umbrais,
Com o nome «Nunca mais».
Mas o corvo, sobre o busto, nada mais dissera, augusto,
Que essa frase, qual se nela a alma lhe ficasse em ais.
Nem mais voz nem movimento fez, e eu, em meu pensamento
Perdido, murmurei lento, «Amigo, sonhos — mortais
Todos — todos lá se foram. Amanhã também te vais».
Disse o corvo, «Nunca mais».
A alma súbito movida por frase tão bem cabida,
«Por certo», disse eu, «são estas vozes usuais.
Aprendeu-as de algum dono, que a desgraça e o abandono
Seguiram até que o entono da alma se quebrou em ais,
E o bordão de desesp'rança de seu canto cheio de ais
Era este «Nunca mais».
Mas, fazendo inda a ave escura sorrir a minha amargura,
Sentei-me defronte dela, do alvo busto e meus umbrais;
E, enterrado na cadeira, pensei de muita maneira
Que qu'ria esta ave agoureira dos maus tempos ancestrais,
Esta ave negra e agoureira dos maus tempos ancestrais,
Com aquele «Nunca mais».
Comigo isto discorrendo, mas nem sílaba dizendo
À ave que na minha alma cravava os olhos fatais,
Isto e mais ia cismando, a cabeça reclinando
No veludo onde a luz punha vagas sombras desiguais,
Naquele veludo onde ela, entre as sombras desiguais,
Reclinar-se-á nunca mais!
Fez-me então o ar mais denso, como cheio dum incenso
Que anjos dessem, cujos leves passos soam musicais.
«Maldito!», a mim disse, «deu-te Deus, por anjos concedeu-te
O esquecimento; valeu-te. Toma-o, esquece, com teus ais,
O nome da que não esqueces, e que faz esses teus ais!»
Disse o corvo, «Nunca mais».
«Profeta», disse eu, «profeta — ou demónio ou ave preta!
Pelo Deus ante quem ambos somos fracos e mortais,
Dize a esta alma entristecida se no Éden de outra vida
Verá essa hoje perdida entre hostes celestiais,
Essa cujo nome sabem as hostes celestiais!»
Disse o corvo, «Nunca mais».
«Que esse grito nos aparte, ave ou diabo!, eu disse. «Parte!
Torna à noite e à tempestade! Torna às trevas infernais!
Não deixes pena que ateste a mentira que disseste!
Minha solidão me reste! Tira-te de meus umbrais!»
Disse o corvo, «Nunca mais».
E o corvo, na noite infinda, está ainda, está ainda
No alvo busto de Atena que há por sobre os meus umbrais.
Seu olhar tem a medonha dor de um demónio que sonha,
E a luz lança-lhe a tristonha sombra no chão mais e mais,
E a minh'alma dessa sombra, que no chão há mais e mais,
Libertar-se-á... nunca mais!
The Raven, de Edgar Allen Poe, traduzido por Fernando Pessoa.
Obrigadinha, pá
A Cibertúlia de um indivíduo que assina duvidoso como Marujo (não é que haja aqui qualquer espécie de intenção sobre a sua orientação naval, nem temos nada a ver como atraca o senhor) e ainda um estranho blogue pictórico que mais lembra o Bela Lugosi, e que se diz chamar Cérebros a Retalho, enviaram publicamente os parabéns cá aos compadres.
A confraria, reunida, agradece. Para visitas a estes senhores, é ali do lado direito.
Breve inquietude adolescente
Indagas se o fio é azul,
indagas sem olhar,
mas o suave toque
na esquina dos dedos,
nos nós dos dedos,
declara um perigo
iminente de explosão e eu
sem querer saber
indago, se cortar
o fio errado,
que mal pode
a explosão fazer?
De Eustáquio Pinho, Fero de Passar a Ferro, Benalla, 1965
1.7.04
UM ANÚS
The Galarzas completam este dia um ano de imbecil e ignara escrita, violência doméstica, insulto gratuito, poesia fácil, descarrilamento amiúde, garrafas de uísque vazias, muita fava, muita sardinha, muita farinheira com ovos, muita telepizza, muita água com gás, muito arroto e muito tabaco. Para melhor conhecerdes estes que aqui escribam diariamente, há 366 dias, sem que nenhum dia tenha falhado uma barbárie, continuai visitando este lindo endereço. Pois que é nossa promessa, na órbita que entra, revelarmos um pouco mais sobre o anonimato de todos.
Um bem haja p'la vossa, como a nossa,
P'lo Comité Lateral
Optimus Galarza
Hino da Final
(Cantarolar c'oa música da Néli Furtado)
Se um durão te abandona logo a meio
E um Santana quer o lugar do primeiro
Se a maioria só grita da varanda
Que no poder não é o povo quem manda
Se o Sampaio está muito baralhado
E o acto nunca mais é convocado
Se quando recebes não te dá pra todo o mês
Faz lá a asneira de votar neles, outra vez
Lev'os à forca
Lev'os à forca
Lev'os à forca
P'las goelas
A aleijar
Lev'os à forca
Lev'os à forca
Lev'os à forca
P'las goelas
A aleijar
Se o Maniche remata ao cantinho
Nem ouves a opinião do Canotilho
Se o Ronaldo cabeceia à baliza
Já nem te lembras do tacho da Maria Elisa
Mas se consegues sair à rua c'oa bandeira
Também tens tempo pra defender a tua veia
Se o teu sangue é mesmo verde e vermelho
Mand'os chupistas todos para o galheiro
Lev'os à forca
Lev'os à forca
Lev'os à forca
P'las goelas
A aleijar
Lev'os à forca
Lev'os à forca
Lev'os à forca
P'las goelas
A aleijar
Forca!
Forca!
Forca!
Forca!
Levanta-te do sofá...
Grita que queres votaaaar!
"Mais perto do céu
Mais perto do cééééu.."
Lev'os à forca
Lev'os à forca
Lev'os à forca
P'las goelas
A aleijar
Lev'os à forca
Lev'os à forca
Lev'os à forca
P'las goelas
A aleijar
Se um durão te abandona logo a meio / Lev'os à forca
E um Santana quer o lugar do primeiro / Lev'os à forca
Se a maioria só grita da varanda / Que as goelas
Que no poder não é o povo quem manda / Não podem apertar
Forca!
Forca!
Forca!
Forca!
À Sôlução
Instalada a euforia pós-jogo, as ruas do país foram invadidas de eufóricos lusitanos. No meio da festa, numa discreta parede do Rossio, em Lisboa, um pequeno cartaz anunciava a solução para os males nacionais que assolam estes dias. Dizia o cartaz:
«Luiz Felipe Scolari a 1º Ministro de Portugal»
Um português em Bruxelas, um brasileiro em Lisboa. 'Tá certo...