30.1.05

Sensibilidade e bom senso



Santana Lopes morreu. Já é um trapo roto que se arrasta pelo país, embotado, sem que lhe valha simpatia ou pena. Perante mil mulheres atira machismo primário. Alvitra que José Sócrates é homossexual, apoiando-se na boataria costumeira dos que nada têm a dizer. É um falhanço total, em que só ele acredita. Quem anda perto destas lides sabe que o PSD já está no velório de Santana Lopes, todo à espera que a capela encerre lá pelas 20h30 de dia 20 de Fevereiro. Os militantes já se cumprimentam pelo pesado pesar, pela custosa derrota, pela imensa asneira. E enquanto velam, nem sequer o corpo do defunto está presente - anda pelo país, taralhoco, a assoar-se e cuspir fungos e bactérias para as plateias. Aliás, o que melhor pode dar, nesta altura, aos pobres portugueses que ainda perdem horas a ouvir patacoadas pacóvias e provincianas. Outra coisa não seria de esperar de Santana, embora toda a gente parecesse estar à espera de melhor.

Desta vez não há ponta final que lhe valha. Paulo Portas percebeu cedo demais a lunática demência e já lá vai à frente, a adejar o papão comunista, a pedir o voto da forma tablóide como só ele sabe. É, pelo menos, uma campanha limpa. Portas está com as duas mãos agarradas aos ombros do eleitor de direita e brada: acorde, homem!

Ao centro, José Sócrates passeia-se sem uma única ideia, um perfeito candidato de generalidade em bico, com propostas que Tino de Rans faria: mais 150 mil empregos, inglês desde a 3ª classe - e bem podia juntar a promessa de um pudim flan em forma de foguete, uma mangueira para cada lar, um bilhete de ida e volta a Mortágua. Tanto dava. Como as coisas são, os lusos eleitores ou botam no PS ou no PSD. Ora, o PSD não concorre desta vez. Quem concorre é a velha contorcionista de traje de luces à Kapital, que de velha se notam já as rugas nas coxas. Assim está Santana. Assim vai Sócrates, nem amado nem odiado. É um candidato translúcido, será um primeiro ministro com entradas de leão e saída de sendeiro.

No velho combate trotsquista-marxista, Jerónimo de Sousa aprendeu a dizer «Bloco de Esquerda» e, cada vez que o faz, ganha mais uns votos. O velho operário não virou a cara à luta e vai perorando sobre a arrogância e a moralidade falsa que Louçã mostra. Aliás, Louçã está nesta campanha como esteve na triste cena em Dona Maria, quando o PSR estava a escassos votos de eleger um deputado em Lisboa e o homem foi atazanar a cabeça aos aldeões, de armas e bagagens, a mendigar-lhes a cruz no boletim. Dona Maria virou-lhe as costas e ele, pedinte, regressou à Rua da Palma sem a eleição. Mas parece que o líder do Bloco não aprendeu a lição de modéstia democrática que ali lhe deram e, também ele, chamou homossexual (ou impotente, sei lá eu) a Paulo Portas, no debate da SIC Notícias. E, dias depois, fazia uma semi-contrição nas páginas do Público. Mas ele não vira a cara à luta, por isso nunca dará a outra face.

Francisco Louçã é uma desilusão. Mas o Bloco é uma desilusão maior, por deixar que este homem, deputado brilhante mas péssimo em campanha, se apodere de todo o espaço mediático do movimento. O Bloco deixa que pessoas como Ana Drago, Luís Fazenda, João Teixeira Lopes ou Fernando Rosas fiquem na sombra mediática, sem se saber porquê. É verdade que foi uma citação, mas foi Drago que disse a Barroso que o governo dele não ia cair, ia sair com benzina, porque era uma nódoa. E acertou, nesse inaugural discurso no parlamento.

Perante o cenário, e outros ridículos ali misturados, como Nuno da Câmara Pereira e Manuel Monteiro, votar dia 20 vai ser um acto de enorme generosidade dos portugueses perante os seus políticos. Não um dever cívico, mas uma demonstração de que, neste país, mais vale o povo.