Deus e os vindouros
Depois da morte de 30 mil tipos no sudeste asiático, eis que a comunidade dos blogs, refastelada no seu sofazinho, com a mente tranquila porque já mandou, decerto, umas centenas de euros para ajudar os pobres malaios ou os desconchavados indonésios, se lançam a debater ou não a existência de deus nosso senhor por causa da onda.
Os ateus deitaram-se a culpar deus. Deus isto, deus aquilo, o homem está doido, o homem já não sabe o que faz, o homem mata-me agora trinta mil gajos, vejam lá se alguém pode acreditar nele! Ou seja, os ateus, não os agnósticos, que a esta hora ainda estão a perguntar-se “foi ele? que raio! terá sido?”, os ateus, dizia, são os primeiros a sossegar os crentes. Porque como não encontram culpado nenhum, como não têm bode expiatório, atiram a responsabilidade para cima de deus. Ora toma, que se tens as costas tão largas como a eternidade, leva lá mais esta culpa, que é para aprenderes.
O absurdo vai tão longe e é tão patético que estes ateu, que agora andam ai aos saltos, questionam mesmo a existência de deus à luz do que se passou.
Ó meninos, digo eu que não creio na existência da divindade ou das divindades, de Shiva a Jeová, não sereis vós os primeiros a precisar tanto de deus que o recusais tão lestos e desonestos? Afinal, porque é que sempre que há uma catástrofe natural, V.Ex.as se viram imediatamente para cima a protestar? Ele não vos sai da cabeça, admitam. Ele é o vosso pior terror, o ópio que temem, a figura que vos assusta. Há culpa? O caso ultrapassa a ONU? Não tem causador? Ora, então, foi deus!
Coisas que podiam ser culpa de deus, na óptica dos ateus:
- A vinda de Cristo
- O dilúvio
- A expulsão de Trotski do paraíso
- O empadão de carne
- A chegada dos americanos à Lua (dos russos já era admissível, porque não havia deus naqueles tempos)
- As nódoas do molho à espanhola
- A corrida de S. Silvestre da Amadora
- A Merche Romero
Mas, se os ateus correm para deus nas horas de aflição - é giro, porque não podem mesmo fazer nada, limitam-se a ouvir o número de mortos e a praguejar -, os crentes desatam a assobiar para o lado. Se as coisas boas são milagres (a D. Francisca não andava há 20 anos. Diz que viu nossa senhora. Passou a andar. Foi deus), as más são coisas “da natureza”, que acontecem dentro do “livre arbítrio”, que os teólogos já descreveram como não estando no small print que deus deixou aos humanos.
Isto é, milhares de mortos de uma assentada, ainda por cima causados pela natureza - onde deus está e é, dizem as escrituras - nada tem a ver com o altissimo. “Azar”, “é a vida”, e outros lugares comuns.
Para os crentes, a obra de deus reúne apenas uma espécie de best-of da eternidade, a saber:
- O moscatel de Alijó
- A música a capella
- Miguel Ângelo e a estátua de David
- Beringelas grelhadas com manteiga de alho
- O “Lebrinha” em Serpa
- Os “gibis” do Mauricio
- A pernoita
- A ambigamia
- A Scarlett Johansson
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