Que desvelos a gente gastava em frente do amor
A BELA DO BAIRRO
Ela era muito bonita e benza-a Deus
muito puta que era sempre à espera
dos pagantes à janela do rés-do-chão
mas eu teso e pior que isso néscio desses amores
tenho o quê? quinze anos
tenho o quê uns olhos com que a vejo
que se debruçava mostrando os peitos
que a amei como se ama unicamente
uma vez um colo branco e até as jóias
que ela punha eram luzentes semelhando estrelas
eu bato o passeio à hora certa e amo-a
de cabelo solto e tudo não parece
senão o céu afinal um pechisbeque
ainda agora as minhas narinas fremem
turva-se o coração desmantelado
amando-a amei-a tanto e sem vergonha
oh pecar assim de jaquetão sport e um cigarro
nos queixos a admiração que eu fazia
entre a malta não é para esquecer nem lá ao fundo
como então puxo as abas da farpela
lentamente caminho para ela
a chuva cai miúda
e benza-a Deus que bonita e que puta
e que desvelos a gente
gastava em frente do amor
de Fernando Assis Pacheco, 1937-1995
Licenciado em Filologia Germânica, foi jornalista e crítico literário. Mandou à merda quem devia, mandou-nos estudar o povo, mandou a vida para o galheiro e foi-se. Em 1995 fizeram-se alaridos, esquerdistas pincharam, direitistas homenagearam a sais de fruto. Hoje, preferem o Big Brother ao Assis nos manuais escolares. Por aqui, continuas em casa. Não temos argentários. E só ao malte damos usuária
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