17.9.03

A Ti Blé, velho mineiro de S. Domingos

Pousas

Não há asas, bicicletas
As ruas emigraram
E deixam terra batida

Não há árvores, trovadores
Há mulheres caladas, na azenha
Uma torrada de azeite e açúcar

A calça de fazenda perde o vinco
E nos meandros da cidade
Julgam-te um mito, uma inverdade

A ti nunca ninguém te convidará
Para ir ao Lux, para comer na Bica do Sapato
A ti espera-te uma enxada
A Achada do Gamo
O jorrar da água pelos regos
do vinho nas goelas
do suor

Pousas
E quando o fazes é para sempre
Porque nunca pousaste para ir ao Algarve
Não levaste os miúdos à escola porque
não foram
(alinhavaram milhões de sapatos de pele)

Pousas
E por isso
Alguém te leva flores de plástico
Para te embelezar a lápide

Porque só cá voltam
Nas férias
No natal

Porque eles também pousaram
Mas muito mais cedo
Mas vivos
E não sabem disso